quarta-feira, abril 25, 2007

Insatisfação

Uma das principais características do Português é a insatisfação.
O Português está sempre descontente com algo … refila bastante, mas é bastante inconsequente, pois raramente leva o seu protesto até ao fim . Parece até que se satisfaz em protestar, apenas por protestar, como se essa fosse a consequência lógica dos seus actos.
A insatisfação está-nos no sangue. É como que algo de genético, algo que é mais forte do que nós … como que uma necessidade imperiosa .
A tendência é tão forte que quando alguém não se queixa de algo … é porque não é português, concerteza !
Por isso, se passarmos algumas horas, dias de felicidade pura, sem queixas … logo uma luzinha vermelha se acende dentro de nós e uma sirene estridente de alarme, nos chama à razão e nos recorda da necessidade imperiosa de refilar com algo ! Aquele estado não pode ser real … deve ser uma ilusão … se calhar algo ou alguém nos está a enganar ?
Como a perfeição não existe, o simples acto de nos podermos sentir 99% felizes, apenas serve para chamar a atenção para o 1% em falta …. E aí é que está a porra !
Depois a importância que atribuímos a essa 1% em falta, faz crescer esse sentimento até um nível desproporcionado, mas que nos deixa em paz com as nossas origens …
Falta sempre qualquer coisa e isso nos deixa insatisfeitos, ainda que por vezes não sabemos bem com o quê.
Refilamos com o governo ! Claro !
Refilamos com o chefe. Evidentemente !
Refilamos com o clima. Pois !
Estamos insatisfeitos com os filhos, a mulher, o emprego, o clube de futebol …
Detestamos a barriga que cresce, o cabelo que cai, a ruga que aparece …
Não nos falta a comida à mesa, mas não damos valor a isso … que interessa ?
Podemos sair à rua, sem nos cair uma bomba em cima, ou sermos atingidos por algum tiro perverso … que interessa ?
Temos saúde e um médico a quem recorrer, quando nos dói qualquer coisa …. Que interessa ?
O que interessa realmente é que não ganhámos o Euromilhões ! O que interessa é que não temos um carro tão potente como o do vizinho ! O que interessa é que nunca fomos a Nova York! O que interessa é que não temos uma quinta XPTO, como a tia da revista!
Então vamos desatar a ser infelizes à força toda ! Bora ! Vamos já !
E venham daí os Prozacs, os ansiolíticos e os anti-depressivos. É que por vezes abusamos na nossa infelicidade, na nossa insatisfação … e caímos num poço tão fundo, que já nada nos salva …
Que pena ! Esta insatisfação crónica impede-nos de darmos o salto para o FUTURO.
Ficaremos eternamente a carpir o passado, roídos de inveja dos outros.
Faz-me lembrar o Calimero ( um desenho animado da minha infância ): É uma injustiça, é uma grande injustiça !!!

3 Comments:

Blogger Pedro Nuno Teixeira Santos said...

Tal faz parte da nossa carga genética colectiva...nunca nada está bem, nem com o país, nem connosco.

Quando dois espanhóis que se conhecem, mas não se vêem há muito tempo, se encontram é sempre uma "festa"...

Dois portugueses na mesmíssima situação aproveitam logo para por em dia as suas "queixas"..e então se estiverem acima dos 65 anos, tal significa um desfilar de maleitas e medicamentos...

Somos nós, não conseguimos mudar...

1/5/07 17:18  
Anonymous Anónimo said...

Antes de mais, queria dizer-te que, mesmo sem reacções, comentários, etc. o teu blogue é lido, joão, por vezes, por muito mais pessoas do que pensams (como vim a constatar com o meu falecido blogue).
MAs adiante: há verdade que nos custa ouvir. Se calhar, até mesmo os que se insurgem contra os malefícios da insatisfação e o péssimismo portugueses, vão discordar do que diz no texto mais adiante e irão achar estranho que eu venha aqui citar um senhor (j. Cesar das Neves) que não merece qualquer simpatia da minha parte, mas que aqui julgo ter acertado na "mouche". O problema é que nós só vemos mesmo aquilo que queremos ver e o resto varremos para debaixo do tapete. Concorde-se ou não, aqui vai! Vocês são livres para pensar o que quiserem (RV):

A crise actual resulta de uma espécie de aquecimento global: os nossos salários estão demasiado elevados para a produtividade. Isso derrete a nossa competitividade, leva à extinção de vários sectores, altera o clima das empresas. Foi isso que veio denunciar o recente Boletim Económico do Banco de Portugal, perante a indignação de sindicatos e comentadores. Esses interesses, que pretendem seduzir a opinião pública a ignorar o óbvio, mostram que esta é uma verdade muito inconveniente.

A balança externa tem um défice ao nível do pior da nossa História Moderna. Temos desemprego, crescimento baixo, falta de competitividade e elevados custos laborais. Não é preciso muito para compreender que o último facto causa todos os anteriores. É verdade que existem muitas outras coisas a afectar a nossa conjuntura. A crise orçamental e a invasão chinesa, os problemas educativos e a derrapagem na saúde, mudança de tecnologia, moeda única e alargamento europeu. Mas não está aí a causa específica da situação. As crises orçamentais e ameaças externas têm-se repetido por cá sem darem crises e os problemas educativos e sanitários são endémicos na sociedade portuguesa. Quanto às outras mudanças, elas trazem tantas oportunidades quanto perigos. Apontar esses elementos não é diagnóstico, mas simples sumário descritivo.

O busílis da questão é que Portugal é o país dos Quinze que nos últimos dez anos mais aumentou os seus custos de trabalho por unidade produzida. Quase todos os nossos parceiros e a média europeia reduziram esses encargos, que nós temos subido. Este indicador, relacionando o crescimento dos salários com a produtividade, é uma das formas mais adequadas de apreciar a evolução da competitividade de uma economia. Tal significa que perante os desafios da globalização os Estados europeus têm feito reformas e ajustado as suas economias, enquanto os portugueses se deixam embalar em retóricas enganadoras e direitos adquiridos.

Dito de forma mais directa, a causa principal do enorme e teimoso desemprego e da anemia produtiva que nos assolam é os nossos salários andarem demasiado altos. Perante isto muitos respondem, com irritação e desprezo, apontando para o baixo nível das suas remunerações relativamente ao que ganham os estrangeiros ou os políticos. Mas não é com esses que se deve fazer a comparação. O confronto que importa é com a produtividade, o que se consegue precisamente pelo estudo dos custos de trabalho por unidade produzida, que nos diz que estamos a ganhar de mais para o que fazemos.

Essa é aliás a razão da invasão de imigrantes, atraídos pelas generosas condições que nós minimizamos e eles desejam. Aceitando montantes menores que os que exigimos, ficam com os empregos que os portugueses não querem. Desde o início do ano 2000 a nossa economia tem mais 232 mil desempregados. Mas no mesmo período não se reduziram os postos de trabalho disponíveis, antes aumentaram de uns impressionantes 170 mil lugares. A economia portuguesa, apesar da crise, está a criar muitos empregos. Mas empregos que os portugueses desdenham e os estrangeiros vêm ocupar.

Desemprego, défice externo, estagnação, imigração, todos os sintomas nos dizem que só recuperaremos a dinâmica económica se reduzirmos o nível salarial e mudarmos a legislação laboral, ajustando-os à realidade. Isso acabará por ser feito, quer queiramos quer não, através das falências, despedimentos, recessão económica. Seria muito mais rápido e saudável se fosse assumido explicitamente e corrigido conscientemente.

Infelizmente muitos interesses gostariam de poder ignorar esta realidade. Atribuindo a outros as suas responsabilidades, evitam o que é preciso fazer. Esses têm o poder para adiar a terapêutica e arrastar a crise muito mais do que seria preciso. Mas a economia, como o clima, tem uma característica definitória, o seu impiedoso realismo. Quem se recusa a atender às suas previsões, em nome de doutrinas e ideais, sofre sempre as consequências. Esta é uma verdade muito inconveniente.

2/5/07 16:03  
Blogger Unknown said...

Caro Rodrigo
O teu texto deixou-me algo pensativo. Ainda não o digeri completamentamente ( é sempre algo brutal dizer a alguem que está a ganhar demais! ).
Concordo com algumas das coisas que dizes, especialmente quando falas da baixa produtividade e do aumento dos custos do trabalho .
Acho no entanto que o caso é mais complexo do que aquilo que foi exposto.
Apesar do receio de estar a omitir factores importantes acho que a baixa produtividade não se deve só à preguiça, ao laxismo e à insatisfação. O problema é ancestral e para melhor o compreendermos teriamos que mergulhar a fundo na História de Portugal.
Uma criança quando cresce num determinado local herda não só o património genético dos seus progenitores, mas também o património social e moral desse mesmo local, desse país. Herda um conjunto de crenças, de hábitos, de valores morais, de usos e costumes, que lhe são transmitidos de forma consciente e também inconsciente por tudo e todos á sua volta. A isto eu chamo o "fado", apesar de muitos não gostarem da designação.
Aprende desde muito cedo a aceitar a "cunha", a tolerar a currupçãozinha, o esquema, o truque. Aprende a sentir inveja pelo sucesso alheio, absorve o individualismo e a teoria de "escalar sózinho" a montanha ...
Recebe a desconfiança e exercita-se na arte de refilar, reclamar, porque lhe ensinaram que "quem não chora, não mama". Descobre como arranjar bodes expiatórios e atribuir aos outros as responsailidades, que não quer assumir. Aprende a sentir-se infeliz, sente-se injustiçado e acha que merece sempre mais e melhor, mas não faz muito por isso, porque afinal de contas a culpa é do outro e não dele próprio!
Enfim nem tudo é negativo e o Português tem qualidades, por vezes até bastante boas, como a capacidade de se superar, de recuperar de situações, quase impossíveis, de desenrascar e solucionar, quando outros já sentiam tudo perdido.
Então o que falta ?
Falta o clic ! ... falta o golpe de magia, que o faça dar o salto, falta o acreditar ... falta o golpe de rins, que o faça saltar de um extremo para o outro ( sim porque não somos povo para se quedar no meio, antes para oscilar entre os extremos ).
Quanto aos ordenados altos ... sim, em parte ... por exemplo, posso falar por mim: como sabes há uns 4 anos, que não sou aumentado (sou um maldito funcionário público como sabes!). No entanto trabalho mais, do que há 4 anos atrás, mas produzo menos! ... passo a explicar: o meu acréscimo de trabalho, corresponde a um acréscimo de buracracia inútil, de trabalho escusado e fútil, que nos tem sido imposto... e que nos consome, nos desmotiva ... e que nos rouba o tempo para aquilo que verdadeiramente interessa, que é útil, necessário e precioso .
Por isso, eu como tantos outros andamos desmotivados, fartos e perdemos a esperança, nalguma curva da estrada ...
Chegamos assim ao beco sem saída (terá ?), ao pântano de que falava Guterres: Ganhamos pouco, porque produzimos pouco ? ... ou será que produzimos pouco, porque ganhamos pouco ?
É como aquela velha questão de que o que terá aparecido primeiro: o ovo, ou a galinha ?
Se for verdade que os nossos ordenados estão altos (questionável, mas ainda assim suponhamos que sim ) então a questão seguinte é por onde começar a cortar ? Como avaliar fulano ou beltrano, no país das cunhas, dos compadres e dos primos?
Como dizer á inflação, para parar um bocado, que agora não vale, pois vamos baixar os ordenados ? Como evitar que os nossos melhores cérebros e bons trabalhadores, fujam para a Europa, ou outros El Dorados, onde certamente trabalharão mais, mas também ganharão muito mais ?
Onde está o lider incorruptível e impoluto, que nos vai indicar com mão de ferro o caminho para o Futuro, sem ceder a pressões, a jogos a influências ?
Como ensinar os nossos filhos que compensa ser honesto, trabalhar bastante e seguir alto nos estudos, se os exemplos lá fora são exactamente os opostos ?
Como mostrar aos criminosos, que o crime não compensa, se a Justiça é injusta e não funciona ?
Bom este post, já vai longo.
Por agora chega.
Obrigado, por teres escrito, por teres comentado, por me teres posto a pensar.
Para mim é essencial o confronto de ideias, essa é a razão que esteve na génese dos Fragmentos.
Sinto que falamos pouco destas coisas. A fatalidade é também uma característica nacional e por vezes mesmo sem querer cedemos a ela.
Um abraço.

3/5/07 20:40  

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